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Combate ao feminicídio é luta política urgente

Negras e pobres são estupradas, agredidas e mortas em maior número pela falta de acesso a recursos de proteção e defesa

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Combate ao feminicídio é luta política urgente

Negras e pobres são estupradas, agredidas e mortas em maior número pela falta de acesso a recursos de proteção e defesa

Precisamos falar mais sobre as causas do aumento dos feminicídios no Brasil. A pandemia, com o isolamento social, e a crise econômica, com a degradação das condições de vida, contribuíram para o agravamento, mas é flagrante a centralidade também do desprezo dos últimos governos por políticas públicas preventivas e protetivas. Derrubar essa estatística envolve não apenas o combate emergencial às questões circunstanciais, mas também a desconstrução de uma cultura colonial, patriarcal e fundamentalista, que nos subalterniza e nos submete ao ódio dos homens.

  • No Brasil, a estatística de feminicídios se agravou em 10,8% nos últimos quatro anos, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. No Rio, a escalada foi maior: em cinco anos, houve aumento de 73%, segundo o Instituto de Segurança Pública. Essa violência de gênero tem a ver com um ideário que nos objetifica e nos classifica como propriedade dos homens. Enfrentar essa cultura em sua raiz exige mexer profundamente nas estruturas da nossa sociedade.

Uma mulher preta como eu, filha da favela, conquistar a presidência da Comissão Permanente de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) significa pôr uma lupa no fato de que negras e pobres são estupradas, agredidas e mortas em maior número pela falta de acesso a recursos de proteção e defesa. Estar nesse lugar, como a mulher mais votada da história da Alerj, significa também uma conquista coletiva na luta histórica feminista contra a violência e as desigualdades de gênero e por políticas públicas de prevenção, de proteção e de garantia de direitos. A responsabilidade e o desafio também são coletivos.

Enfrentar a violência de gênero no Rio, berço de um projeto político que faz do machismo bandeira programática, exige encará-la prioritariamente na política. Esse projeto se desdobra num cotidiano de ofensas e agressões a mulheres parlamentares pretas. O feminicídio político de Marielle Franco, em 14 de março de 2018, foi expressão máxima dessa violência política. Até hoje não conhecemos os mandantes do crime.  

No Rio, foi criada recentemente uma Secretaria da Mulher. Boa notícia. Só não foi possível compreender o motivo de ter havido redução de 88% no orçamento de 2023 para ações de proteção e defesa das mulheres. Em 2022, a previsão orçamentária já era insuficiente perante a demanda de ações emergenciais de acolhimento e proteção, de orientação jurídica, acompanhamento psicológico, assistência social, abrigo seguro. Que dirá do investimento em educação e cultura para formar pessoas para a igualdade e o respeito entre gêneros. Há muito por que lutar.

Esse cotidiano de violência de gênero exige mudança radical e urgente de rumos. Com a eleição de Lula, e uma nova concepção de Ministério da Mulher, abrem-se novas possibilidades de diálogo com os movimentos organizados e de atendimento às demandas históricas feministas. Mas, ao fim, seremos nós, as mulheres, que teremos de seguir cada vez mais unidas, organizadas e mobilizadas para ocupar as ruas, as redes e os espaços da política na luta para conquistar os avanços de que tanto precisamos.

A propósito, será por nossas vidas, por nossos direitos, por nossa liberdade e por mais democracia que amanhã, Dia Internacional da Mulher, vamos às ruas honrar a memória, o sangue e o futuro das nossas tantas e imprescindíveis Marielles e Marias.

*Renata Souza, deputada estadual (PSOL-RJ), é jornalista, doutora em comunicação e cultura e presidente da Comissão Permanente de Defesa dos Direitos da Mulher da Alerj

O Globo

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