Rio - Num intervalo de apenas 24 horas, dois tiroteios motivaram a paralisação de composições na estação de Manguinhos, na Zona Norte do Rio. O último episódio, que ocorreu por volta das 6h desta quinta-feira, deixou uma vítima. A auxiliar de serviços gerais Dinalva Medeiros Santiago, de 63 anos, foi atingida por uma bala perdida na perna esquerda enquanto esperava a condução para ir ao trabalho. Na quarta-feira, a circulação de trens no ramal Saracuruna foi interrompido por uma hora. Uma rotina de medo, que tem se repetido neste ano para cerca de 600 mil pessoas que circulam por dia nas composições, segundo a SuperVia. Dos 21 tiroteios que causaram a interrupção do serviço no Rio neste ano, 14 foram nas imediações da estação de Manguinhos, o equivalente a uma paralisação por semana. A cada três tiroteios que motivaram a paralisação de composições de janeiro para cá, duas ocorreram na região.
Aliás, a incidência desse tipo de ocorrência disparou nos últimos anos, conforme aponta um levantamento feito pela SuperVia a pedido da reportagem do DIA. Em Manguinhos, as paralisações deste ano já igualaram os casos ocorridos em todo o ano passado. Em 2016, essa situação ocorreu quatro vezes na região. Em 2017, foram cinco paralisações. Uma realidade agravada pela queda brusca do policiamento feito pelo Grupamento de Policiamento Ferroviário (GPFer), responsável para atuar próximo às linhas do trem.
Tiroteio afetou a circulação dos trens do ramal Saracuruna - Reprodução / InternetEm 2007, a unidade contava com cerca de 400 homens. Hoje, são apenas 80 agentes de segurança. Apesar do efetivo reduzido, o major Wagner Marques, comandante da unidade, pretende intensificar as ações na área. "A área é extremamente abrangente e o que não falta é estação com venda de droga", disse. Paulo Storani, especialista em segurança pública e ex-capitão do Bope, acredita que o aumento das paralisações na estação de Manguinhos está relacionado com a intensificação das operações policiais na região, sob domínio do tráfico. "Quando a polícia opera, o sistema é paralisado para diminuir os riscos em uma área
onde há criminosos armados".
Normalidade após tiros
Após o confronto que deixou uma pessoa ferida, na manhã desta quinta-feira, uma equipe de reportagem do DIA percorreu a estação de Manguinhos, no ramal Saracuruna. Apesar do episódio, o clima entre os passageiros era de aparente normalidade. "A sensação é de tensão, como se algum passageiro pudesse ser atingido a qualquer momento. Infelizmente, isso faz parte da rotina", comentou uma passageira, que não quis se identificar.
Dinalva foi atingida na perna - SBT RioA enfermeira Erica Santos Cruz, de 38 anos, costumava passar por Manguinhos para ir ao trabalho na Tijuca. Mas mudou de emprego para fugir da violência. Hoje, ela desce em Bonsucesso, uma antes da estação do medo. "Mudei de serviço e ganho menos. Mas me sinto mais protegida. Afinal, só quero chegar em casa com vida".
Vítima convive com tiroteios
Atingida na manhã desta quinta na perna esquerda por uma bala perdida na estação de Manguinhos da SuperVia, Dinalva Medeiros Santiago esperou por mais de três horas para ser atendida no Hospital Municipal Souza Aguiar, no Centro. Como a bala atravessou a coxa, não foi necessário fazer o procedimento cirúrgico.
Ela recebeu alta às 14h. O mototaxista Ismael Medeiros Santiago, filho da vítima, disse que estava dormindo quando foi informado por vizinhos do episódio. "Às vezes, quando está tendo tiroteio, minha mãe muda o caminho para ir ao trabalho. Mas hoje, quando os tiros começaram, ela já estava dentro da estação", lamentou Ismael, que acompanhou a mãe na emergência do hospital.
A Secretaria Municipal de Saúde nega demora no atendimento."Dinalva foi imediatamente atendida assim que deu entrada na Sala Vermelha da Emergência e toda a assistência foi feita conforme protocolos de trauma, incluindo avaliação por diferentes especialistas e exames específicos solicitados pelos médicos", disse a pasta, em nota.
Deputada estadual pede investigação
Moradores das favelas de Manguinhos, Jacarezinho e Mandela convivem em meio a confrontos. Levantamento de O DIA registrou pelo menos 11 confrontos neste ano em ações policiais. Em quatro delas, houve a participação de unidades de elite, como Bope e Choque.
Além disso, moradores denunciam a atuação de snipers, os atiradores de elite. Em janeiro, familiares do porteiro Rômulo Oliveira da Silva, de 37 anos, afirmaram que ele teria sido morto por um disparo de um sniper. O tiro teria partido de uma torre dentro da Cidade da Polícia. No mesmo dia, um ajudante de pedreiro foi atingido por um tiro nas costas.
A deputada estadual e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Alerj, Renata Souza (PSOL), protocolou um pedido para que o Ministério Público investigue a suposta ação de snipers em operações policiais.
Jornal O Dia